sábado, 31 de março de 2012

Sobre melecas e iphones


Desde que surgiu na minha vida essa maravilha chamada smartphone e, mais ainda, esse vício chamado iPhone, que eu venho notando nascer em mim uma relação de amor e ódio. Apesar de AMAR o meu e dele não abrir mão, eu fui aos poucos notando a capacidade que esse aparelhinho diabólico tem de aumentar a minha ansiedade a níveis extremos. Ele simplesmente deletou da minha rotina o "parar e observar". Eu não espero mais o elevador olhando os números dos andares irem diminuindo em cima do botão, pego o telefone e dou um olhada no que andam falando no twitter. Sala de espera de consultório não significa mais ouvir Antena 1 e pensar no que eu ainda tenho que fazer no dia, mas abrir o Instagram e ver como são lindas as fotos daquela amiga que eu sigo. Parei no sinal? Não olho mais o tiozinho do carro do lado tirando meleca do nariz, mas abro o facebook e dou um suspiro pela quantidade de baboseiras que atolam a timeline. Pior: é visível como, ao invés de aumentar, diminuiu a quantidade de conteúdo que eu consumo. Conteúdo, não fragmentos de conteúdo. Ando lendo menos livros, comprando menos revistas e vendo menos filmes. Ainda que eu continue fazendo tudo isso, às vezes me pego parando a minha leitura e dando uma olhada geral no celular para ver o que anda acontecendo pelas redes sociais. Pode?
O David Coimbra escreveu uma crônica excelente na Zero Hora de ontem dizendo, basicamente, que a sua capacidade de ler é bem inferior à quantidade de livros que o interessam, razão pela qual ele não pode perder tempo - e precisa estabelecer critérios. Diz, assim, que não se dá ao luxo de perder uma hora no facebook quando podia estar terminando a 50ª página de um bom livro. A Cláudia Laitano, na Zero Hora de hoje, comenta que na era da superabundância de informação, eleger prioridades tem se tornado cada vez mais difícil: cultura pop e cultura erudita, diversão e notícias, presente e passado. São muitas as vozes que disputam nosso tempo e nossa atenção. Sem foco, piramos na rotina alheia e esquecemos de alimentar a alma.
Eu não sou tão extremista quanto o David, valorizo as facilidades decorrentes desse novo momento tecnológico. Usufruo delas, inclusive. Me incomoda, contudo, notar o quanto elas alteraram a minha própria rotina - e em diversos aspectos para pior. Pior para mim. As possibilidades que o Twitter traz, a aproximação que o facebook acarreta e a admiração que uma foto de um momento especial postada no instagram gera são maravilhosas. Mas preciso tratar isso como um pequeno momento do meu dia e voltar a acalmar o espírito, chegar em casa, largar o celular de um lado, deixar o computador desligado e devorar 50 páginas do meu livro. Conseguir ver dois filmes seguidos sem pensar em qualquer conectividade que não seja com a trilha sonora. Dormir lendo a Piauí. Preciso voltar a conseguir não fazer nada. É isso: a meta é conseguir voltar a rir sozinha, sem fazer nada, ao pegar os tiozinhos no flagra tirando meleca do nariz no sinal fechado.

domingo, 25 de março de 2012

Tudo que eu gosto. Tudo que eu quero.



Gostar ou não de uma música, na minha humilde opinião completamente sem embasamento técnico, é muito mais consequência das nossas experiências pessoais do que de grandes análises técnicas - pelo menos para a grande maioria dos mortais. Muito além da análise da voz, da melodia ou do solo de guitarra perfeito de determinado som, é ao que aquela voz, melodia ou solo nos remete que nos faz gostar mesmo dele. Uma música que nos toca, em síntese, é muito mais reflexo das sensações que ela nos evoca do que qualquer outra coisa.

Tudo isso para dizer que viciei nesse som e não paro de ouvir. Até dá para não gostar de hip hop, odiar o Snoop Dog, mas quem tem pelo menos um pouquinho de "young", algum desejo de "wild" e uma adoração pela sensação "free", vai - se não gostar - pelo menos entender.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Vivendo



Disse Rilke:

"O senhor é tão jovem, tem diante de si todo começo, e eu gostaria de lhe pedir da melhor maneira que posso, meu caro, para ter paciência em relação a tudo que não está resolvido em seu coração. Peço-lhe que tente ter amor pelas próprias perguntas, como quartos fechados e como livros escritos em uma língua estrangeira. Não investigue agora as respostas que não lhe podem ser dadas, porque não poderia vivê-las. E é disto que se trata, de viver tudo. Viva agora as perguntas. Talvez passe, gradativamente, em um belo dia, sem perceber, a viver as respostas. Talvez o senhor já traga consigo a possibilidade de construir e formar, como um modo de viver especialmente afortunado e puro; eduque-se para isso.

Mas aceite com grande confiança o que vier, e se vier apenas de sua vontade, se for proveniente de qualquer necessidade de seu íntimo, aceite-o e não o odeie. A carne é um fardo, verdade. Mas é difícil a nossa incumbência, quase tudo o que é sério é difícil, e tudo é sério. Se o senhor reconhecer apenas isso e chegar a conquistar, a partir de si, de sua disposição e de seu modo de ser, de sua experiência e infância e força, uma relação inteiramente própria (não dominada pela convenção e pelo hábito) com a carne, então o senhor não precisa mais ter receio de se perder e se tornar indigno de sua melhor posse".

Vivendo as perguntas, para um dia, sem perceber, viver as respostas.

...pensamentos, teorias e devaneios...