quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

a interpretação dos sonhos

Não sou muito de sonhar. Raramente lembro o que sonhei, e quando lembro, normalmente vêm imagens desconexas, desprovidas de sentido; penso nelas ao acordar, mas enquanto leio o jornal tomando café, já esqueci...
Nos últimos dias, isso mudou: à noite, meu cérebro tem produzido historinhas cheias de simbolismo, e eu tenho trocado as palavras cruzadas matinais pela decifragem do meu universo onírico, subitamente enriquecido!
Hoje mesmo, acordei me lembrando de tudo: eu passava um tempo em uma prainha bem primitiva, paradisíaca, com um grupo. Um sujeito desse grupo era um poço de arrogância, um desses urbanóides multiconectados e hiperconsumistas, que se sentia muito superior àquele lugar e às pessoas simples que viviam ali. Era um cara hostil, e atacava um local com deboches, xingamentos e bolinhos de areia (sim, bolinhos de areia, oras). O local, que não era bobo, revidou e saiu a tocar muita areia na nossa casa. Eu, que estava na varanda, fui praticamente soterrada, mas em vez de entrar na guerra de bolinhos, fui falar com o meu colega boçal, que a essas alturas estava bem alterado, com muitas facas nas mãos, os olhos arregalados, injetados de sangue, um horror. Eu falava e ele ia apontando facas pro meu pescoço, mas eu continuava falando, irreconhecivelmente diplomática. Meu discurso era bonitinho, politicamente correto, falava de respeito, das virtudes daquele lugar, daquelas pessoas, da simplicidade. Corta. Pula pra uma cena em que eu acordo, na mesma prainha. Agora já não é mais uma viagem, eu me tornei moradora. Na mesma cama, dormindo comigo, um ex-namorado com quem eu um dia fiz planos na linha de "um amor e uma cabana". Na vida real, esses planos e mais uma série de coisas me encheram de aflição e eu encerrei a história de uma hora pra outra. No sonho, eu paguei pra ver, e ali estávamos, nós e nossa cabana. E a mesma aflição de alguns anos atrás. É como se eu finalmente enxergasse o que poderia ter sido (coisa que muito especulei) e percebesse que não era aquilo que eu queria. O resto do sonho, basicamente, era eu chorando escondida em cenários de babar.
Abri os olhos e me pus a encaixar as peças: o seboso aquele? Era eu. Era meu lado roots, singelo, praiano, dialogando com o meu lado urbano, complexo, sofisticado e um tanto metido. Passei boa parte da minha vida pensando que teria que optar por uma margem do rio, e há pouco me convenci de que o legal é nadar livremente, e me deixar levar pela correnteza de vez em quando. É poder estar hoje no Rosa, de chinelo e biquíni, e amanhã em Londres, em uma cozinha estrelada, e achar as duas experiências igualmente deliciosas. Não à toa a conversa foi tranquila e positiva no sonho - no mundo concreto também imperou a harmonia, finalmente. A parte do meu amor do passado foi redentora: um aval sobre as escolhas que eu fiz. Não andava mais pensando nisso, mas alguma parte do meu subconsciente devia estar precisando desse "selo de garantia".
Esse foi só mais um de uma série de sonhos curiosos que eu ando tendo. No divã, ouvi que era característico dessa fase de finalização do tratamento (sim, estou a um passo da alta, e não é só porque eu vou me mudar pro outro lado do oceano!) sonhar, e nos sonhos ver muitas das conclusões às quais nós chegamos nos últimos anos. Faz sentido.
Também se compreende essa minha sanha interpretativa em dias de casa vazia e nostalgia à flor da pele. Tudo remete à partida, ao porvir, às memórias... Tudo isso é muito bom. Até chorar de saudades - reais ou antecipadas - é maravilhoso. É vida! Cada vez mais bonita.

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