quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Dom Quixote de la América?

No dia em que saiu o resultado das eleições nos Estados Unidos fiquei feliz de saber que um democrata com discurso eloqüente e aparentemente humilde e elegante havia sido eleito para governar o país e certamente se meter no governo do resto do mundo também. Aliás, a decisão do novo presidente dos EUA é tão comentada em todos os lugares, com uma cobertura de 24 horas da mídia e de real importância para o futuro do planeta que deveríamos todos os povos poder votar em democratas ou republicanos. Mas acredito que foi votado para o melhor. “Já estava na hora de mudar!”, pensei. Pelo menos parece que a maioria da população mundial e principalmente os veículos de comunicação concordam comigo.

Porém, minutos depois da divulgação do nome do novo presidente da América, houve dentro de minha própria residência um bombardeio: de e-mails, comentários nas rádios, a televisão só falava nisso, os jornais com capas e mais capas, as revistas perguntando aos pobres leitores brasileiros se este negro americano poderia salvar o mundo? Chegaram a me dizer que havia nascido um novo herói.
- Mas assim tão rápido? Ele nem fez nada ainda! - eu falava com meus botões.

Também nunca tinha visto os veículos de imprensa gaúcha mencionarem alguma nota sobre o Quênia e de repente, não mais do que de repente:
- É feriado no Quênia!, gritavam na TV.
Confesso que fiquei um pouco chocado com aquilo. Não com o fato do feriado em si, mas da importância que aquilo tinha para as pessoas que não foram capazes de me dizer que dia 2 de novembro tinha sido Corpus Christi.


Aquelas bombas foram estourando e estourando e eu me agarrando de nojo e de nojo que já não agüentava mais ouvir falar no tal do primeiro presidente negro dos Estados Unidos, do responsável pelo momento que ficará marcado na história do planeta Terra, do homem revolucionário que veio para mudar: o novo Abraham Lincoln - assassinado com um tiro na nuca durante uma peça de teatro -, o novo John Fitzgerald Kennedy - assassinado com um tiro no pescoço e outro na cabeça durante um desfile de carro na cidade de Dallas -, o novo Martin Luther King Jr. - assassinado baleado por um ex-presidiário -. Só espero que ele também não seja morto como todos esses marcos da história norte-americana. Se bem que se morrer agora ou no dia da sua posse, pelo menos para a sua imagem, pode ser bom, pois aí sim ele ficará mesmo marcado como um super-herói e um salvador do mundo. Claro, não vai nem correr o risco de cometer os erros que ninguém espera ou de não conseguir mudar nada que todos esperam. É mais ou menos como a história de Romeu e Julieta: o amor indiscutível e o relacionamento perfeito. Sim, eles nem chegaram a morar juntos e conviver de mais para cometerem erros e perceberem os problemas um do outro.

Não me lembro de ver reportagens assim tão emocionantes - uma edição perfeita, com os cortes certos, imagens de fotos tratadas da pessoa feliz ao lado da família, depoimentos apaixonados e, é claro, uma música de ritmo emocionante e mensagem condizente com o fato - desde a morte do Airton Senna. Aquelas mensagens que eles espremem, espremem até a gente chorar. O Senna pelo menos chegou no mundo e mostrou a que veio. Se tornou através do seu trabalho um grande esportista. Vamos ver o que será que será do próximo presidente americano.

Se tornará esta mais uma história de um falso-herói? O personagem mais célebre de Miguel de Cervantes é cria dos livros de cavalaria que o tornaram um cavaleiro andante graças aos milhares de livro sobre o assunto que lera e que o transformaram em um louco que achava poder salvar as pessoas e combater os moinhos de vento. Será Barack Hussein Obama um Dom Quixote de carne e osso, porém filho da mídia? Cervantes também conta na mesma história que o personagem Sancho Pança foi se aventurar junto a seu herói Quixote graças às promessas que este o fizera de que poderia governar uma ilha. Pois neste caso, volto a fazer uma analogia em forma de indagação: seremos nós realmente o retrato de um personagem do renascimento espanhol com almas desesperadas por melhorias nas condições de vida e por promessas? Será que nos tornamos todos Sancho Pança’s?

Tomara que possa, de fato, concretizar tudo o que prometeu e o que a população mundial espera dele. Mas quero ter meus pés no chão, fazer um esforço para me lembrar de que ele, pelo menos ainda, é um ser humano e que pode, sim, não salvar o planeta.

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