quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Pipoca

Depois de um período de marasmo cinematográfico na cidade, estrearam há pouco vários filmes que eu andava há tempos querendo assistir. Em vista disso, me propus a ir ao cinema todos os dias desta semana, e embora seja recém terça feira, já me coçaram os dedinhos pra escrever por aqui.
Ontem o eleito foi Julie & Julia. Com a sinopse falando em comida, Cordon Bleu, blog e Meryl Streep, evidente que eu criei grandes expectativas. Mas confesso que no pós-filme cheguei a comentar com alguém que a minha porção cozinheira tinha gostado, enquanto que a porção restante tinha dormido do início ao fim... Meus olhos brilharam nas cenas que envolviam assassinatos de lagostas, suflês de alturas vertiginosas, feiras e boulangeries, mas as historinhas que justificavam toda a comilança não despertaram em mim qualquer emoção além do tédio. Saí do cinema creditando esse desdém ao meu coração de pedra, incapaz de se emocionar com historinhas bonitinhas e mimimí, então nem dei bola, já sei que sou assim mesmo...
Porém, ainda que eu tenha achado a Julia Child muito mala, soltando uns guinchos estridentes a todo momento, e a Julie Powell meio bobinha, com seus constantes meltdowns, as idéias por trás das respectivas histórias me agrada bastante. A primeira era esposa de um diplomata, foi parar na França por conta do trabalho do marido e lá resolveu estudar culinária pra ocupar o tempo, já que o que mais amava fazer na vida era comer. Virou um fenômeno de popularidade e apresentou aos americanos a arte da cozinha francesa. A segunda era uma burocrata, frustrada com o emprego e o apê-ovo no Queens, que decidiu fazer todas as receitas do livro da JuliA ao longo de um ano, postando tudo em um blog. Buscava um novo sentido pra vida, e a empreitada acabou dando muito certo. Por que eu não gostei do filme mesmo? No fundo, acho que impliquei com as duas por ela serem extremamente americanas, uma se recusando a falar francês na França (ou falando DAQUELE jeito...), e a outra um tanto histérica e manteiga derretida (o que ela tomaria como um elogio, garanto).
Hoje é que eu fui me dar conta, por contraste, do real motivo para eu ter torcido o nariz pras "Juliettes": sou muito mais Coco. Pois é, fui ver Coco avant Chanel e cheguei a essa conclusão. A francesinha meio antipática, que não fazia a menor questão de agradar - e ainda assim agradava, segue agradando -, sel made woman, que jamais soube se imaginar como "a esposa de alguém", etc., etc., fez muito mais a minha cabeça. Que os atributos citados não passem uma idéia equivocada: Chanel não foi uma workaholic fria, calculista, desprovida de sentimentos. A mulher amou demais, foi igualmente amada, sofria com o abandono do pai, teve medo de meter os peitos e ir ganhar a vida fazendo chapéus em Paris, tudo isso... E mais, ela sempre soube que não poderia se dar ao luxo de aguardar a aparição de um marido rico que a sustentasse - sem contar que definitivamente não tinha o temperamento que se esperava de uma boa esposa naquela época...
O filme não é nenhuma obra-prima, mas permite que se compreenda bem essa aura de austeridade e mito que cerca a dama que alçou pérolas, tailleurs, bolsas de matelassê com alças de corrente douradas e a cor preta ao status de ícones de estilo atemporais.
Eu sei que é muito fácil aplaudir de pé uma personagem que incorpora com tanta elegância aqueles defeitos mais arraigados em mim mesma. Por outro lado, surge um certo mal estar quando se percebe que muitas vezes, esse tipo de personalidade pode redundar em uma solidão tremenda. Por isso, farei algumas concessões: quando crescer, quero ser uma combinação dessas mulheres todas - cozinheira de mão cheia, e independente, sim, mas com espaço pro riso, pro amor e pra uma que outra frivolidade na vida. E sempre com pérolas em volta do pescoço (bossa que Julia, Julie, eu e milhões de mulheres pelo mundo herdamos de Mademoiselle Chanel).

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